“Codex 632” é a mais recente grande aposta da RTP, em parceria com a Globoplay, no universo do pequeno ecrã. Adaptada da obra homónima de José Rodrigues dos Santos, chega então a jornada de Tomás de Noronha pelos segredos de Cristóvão Colombo.
A abordagem à questão dos descobrimentos em “Codex 632” é de louvar. De quando em vez é um tema que vale a pena revisitar e é algo que a obra de José Rodrigues dos Santos originalmente não abordou. Agora, o seu installment televisivo decide trazer à tona as histórias potencialmente mal contadas desses anos. Afinal de contas, somos processos evolutivos e questionar o que está escrito no papel é fundamental à evolução. É o próprio argumento que começa por criar a expectativa no espectador e, apesar de se inspirar na obra literária, vai mais além.
Tomás de Noronha é a personagem principal desta história. Um pai de família, com alguns problemas familiares aparentemente notórios neste primeiro de seis episódios, professor da Universidade de Lisboa a quem informam que o seu mestre – a pessoa que o acompanhou em vários dos seus estudos – foi assassinado. Na sequência deste assassinato, é convidado por uma entidade aparentemente financiadora da investigação em que o seu falecido mestre embarcou para continuar a sua investigação.
O paralelismo de “Codex 632” às obras de Dan Brown e ao professor Robert Langdon são inevitáveis. É que Tomás de Noronha não é só um professor, como Langdon, não é só confrontado com a morte de uma pessoa a quem esteve conectado durante muito tempo, como Langdon, mas também passeia uma postura altiva e agressiva, tal como Langdon. Apesar desta construção de personagem ser completa e apelativa, é impossível não se ser imediatamente transportado para a realidade d’”O Código Da Vinci”, o que, de certa forma, dá sensação de ser uma cópia.
Paulo Pires é o actor que dá vida a este Tomás de Noronha e, embora até se encaixe à sua maneira no papel, no primeiro episódio sente-se alguma moleta do actor, que em algumas cenas tende a entregar um “registo novela”. Certamente depois de toda uma carreira nesse universo, não é fácil retirar totalmente o peixe desse aquário, mas a verdade é que acaba por se tornar um tanto-ou-quanto deslocado nesta série que pretende ser, à sua maneira, um thriller.
Também no mundo das personagens, há alguns pormenores que deixam alguma urticária. Então, as personagens falam línguas diferentes deliberadamente e entendem-se na perfeição, sem qualquer contexto? Podemos assumir que são aquelas situações de “Se falarem comigo eu entendo, mas não tenho vocabulário para responder”; ou podemos assumir que todos beneficiam dos poderes de tradução da acarinhada TARDIS de “Doctor Who”. Sem contexto, acaba por tornar-se evidentemente estranho, talvez até ridículo, ouvir as personagens a falar em italiano vs. português em conversa e a entenderem-se na perfeição.
Ainda assim, “Codex 632” é um poço de representatividade, abrindo espaço a que o foco da história seja o seu argumento ao mesmo tempo que permite dar palco a toda e qualquer forma de personagem, oferecendo à série uma paleta de diversidade interessante.
Talvez o mais bonito do primeiro episódio de “Codex 632” tenha sido a paisagem, os espaços, os locais. Talvez por isso tenha sido também opção usar e abusar dessa faceta landscape que acabou por tornar este 1/6 da série muito pouco acelerado – ou menos acelerado do que se esperava de um thriller com apenas seis episódios para construir o seu princípio, meio e fim.
Para um primeiro episódio, “Codex 632” deixou um pouco a desejar. Tendo em conta que serão apenas seis episódios, o conjunto de cenas entregues foi demasiado lento. Sendo uma adaptação em co-produção com uma plataforma de streaming como a Globoplay, a expectativa era elevada de que pudesse atingir um nível de avantguard acima do que estamos acostumados a ver em produções com financiamentos substancialmente menores. Não tínhamos necessidade de passar tanto tempo em longos planos de paisagem, ainda que as paisagens do Rio de Janeiro sejam muito bonitas.
Há que enaltecer também a banda sonora e a sua melódica guitarra portuguesa. Se os planos lentos foram sentidamente lentos, a banda sonora acabou por ajudar a complementar tornando-os mais apelativos.
De qualquer forma, os últimos minutos do primeiro episódio de “Codex 632” funcionaram bem. O chamado hook (ou gancho) dos momentos finais consegue forçar o espectador a querer ver o 2º episódio e, quiçá, acompanhar a história de Tomás de Noronha até ao fim, até ao desvendar do mistério investigativo em que se irá colocar.
“Codex 632” estreia dia 2 de Outubro na RTP.